Anitta conquista Harvard em palestra: 'Minha mãe me ensinou o valor de estudar'


Anitta conquistou Harvard. A cantora de 25 anos, criada em Honório Gurgel, contudo, não precisou de nenhum de seus hits na mais prestigiada universidade do planeta: ela prendeu a atenção do encontro de estudantes brasileiros em uma palestra, onde falou de sua origem, de sua estratégia comercial e um pouco de política. Com sua história de superação, defendeu a importância dos valores aprendidos na família para o sucesso.
— Educação é o ponto, a partir do momento em que você educa, você coloca na cabeça do cidadão o que está nas mãos dele — disse ela no encerramento da primeira noite do Brazil Conference at Harvard & MIT, encontro anual organizado por estudantes brasileiros das duas instituições. — Tive uma mãe que, por mais que não tinha tido estudo, ela veio da Paraíba com meus irmãos, me ensinou o valor de estudar. Mas isso dá trabalho, explicar à pessoa como ela faz acontecer dá muito mais trabalho do que entregar na mão dela. Ensinar a pescar dá muito mais trabalho do que entregar o peixe.
— O Brasil chegou já numa fase que não tem milagre. É esperar, ter paciência, educar, e pensar num futuro com um Brasil educado, com estudo e uma educação igual para todo mundo — disse ela, que não citou nominalmente nenhum político ou partido. — Não é investindo na educação hoje que você vai ver o resultado daqui a quatro anos. A gente não pode ter o político que só está pensando em ser reeleito. Ele tem que fazer a parte dele.
'É DIFÍCIL CANTAR O BARQUINHO VAI, A TARDINHA CAI'
Anitta afirmou que o preconceito que existe com o funk por causa de sua origem: música de negro, favelado e excluído. E contemporizou algumas das letras “proibidonas” do ritmo que incomodam parte da sociedade. — Antes de cantar eu nunca tinha ido a zona sul do Rio de Janeiro. É muito difícil você cantar o barquinho vai, a tardinha cai… se você nunca viu essas coisas — disse ela, aplaudida em pé pelos estudantes brasileiros. — O funkeiro canta a realidade dele. Se ele vê gente com arma, gente se drogando, se prostituindo… é a realidade dele! Para mudar as letras do funk, você tem que mudar a realidade de quem está naquela área.
Afirmando que o ritmo do funk brasileiro é super elogiado em todo mundo, conta que viveu muito preconceito no início de sua carreira por causa do estilo. Anitta disse que, para driblar isso, dizia que sua música era pop. Afirmou que o funk ajuda em comunidades carentes, inclusive como forma de geração de renda.
— Na favela, você fica sem oportunidade. Você chega na escola pública, principalmente agora com aprovação automática, você sai e não tem previsão de futuro. Não estou dizendo que o funk é a salvação da pátria, mas eu conheço inúmeros funkeiros, inclusive que eu ajudei, que antes era traficantes, se drogavam….
Contando um pouco de sua história, lembrou quando era vendedora de roupas não teve muito sucesso por ser muito sincera na opinião aos clientes, mas com isso conseguiu pagar as roupas mais formais para trabalhar no estágio que obteve na Vale, onde tinha um salário de R$ 600. Anitta afirma que começou a poupar parte do cachê de R$ 150 de seus shows pensando no futuro. Disse que discordava da gestão do “Show das Poderosas”, onde obteve relativo sucesso, e passou a gerenciar sua própria carreira, onde aliou estudo e focou na criação de uma equipe própria, coesa e que também correu atrás de conhecimento.
— Muita gente não entendia os protestos (de 2013), mas esses 20 centavos faziam muita diferença, esses 20 centavos poderiam impedir meu irmão de ir para a faculdade — conta ela.
Num evento que teve nomes como Ciro Gomes, David Neeleman (fundador da Azul), Gustavo Franco, Cláudio Haddad e Alexandre Padilha, ela teve a palestra mais concorrida do primeiro dia do encontro. Neste sábado debaterão autoridades como Ilan Goldfajn (Banco Central), Luís Roberto Barroso e Luiz Fux (ambos do Supremo Tribunal Federal), Raquel Dodge (Procuradora-geral), Jorge Paulo Lemann (o homem mais rico do país) e Luciano Huck, entre outros.
Anitta disse que sabe que, para pessoas da periferia como ela era, os artistas são modelos. E, por isso, sempre foi transparente sobre suas cirurgias plásticas. Assim, sendo honesta, além de servir de exemplo, ensina que ninguém é perfeito. Com isso, ela acredita que as pessoas vão começar até a votar melhor, não vão escolher os que parecem mais perfeitos que, na verdade, são os mais falsos.
No fim do debate de uma hora com os estudantes, antes de dar uma palhinha muito curta de uma de suas músicas — cantarolou por menos de um minuto a música “Downtown” — ela contou de sua estratégia para conquistar o mercado internacional. Detalhou que calculou como entrar no mercado de língua espanhola e que vai a diversos países para conhecer tendência e ritmos.
— Fui sozinha para a Espanha. Vi que na reunião eles (os empresários) falavam várias balelas da empresa deles. Aí decidi ir para a rua, comecei a pesquisar com o povo. Na balada, pesquisava e perguntava para o DJ — conta.
A artista de “Vai Malandra” e “Prepara” revelou uma estratégia de negócios calculada, que visa a números concretos, como unir o mercado brasileiro e latino para ter musculatura para competir no cenário da língua inglesa. Detalhou os passos para ser conhecida, usando sua participação na abertura das Olimpíadas, ao lado de Caetano e Gil, como propulsor internacional de sua carreira, quando iniciou a série de parcerias internacionais que marcaram seus últimos trabalhos. Em uma plateia com parte da elite de estudantes do Brasil, Anitta surpreendeu com sua receita de sucesso, simplicidade e perseverança. Principalmente a quem não gosta das músicas dela.
Os participantes do evento, o mais concorrido da conferência, no geral gostaram da palestra de Anitta. Flávia Goulart, professor da periferia do Mato Grosso, mas nascida no bairro do Meier, no Rio de Janeiro, afirmou que o discurso da cantora é "empoderador":
— O poder que ela tem com meus alunos é enorme, e acredito que por ela tem esse poder por falar a verdade, e isso ficou claro em sua palestra — disse ela, que foi convidada a participar do evento pelo "Todos Pela Educação". — O interessante é que ela quebra esteriótipos e mostra como ela conseguiu vencer.
Por outro lado, Ana Carolina Venturini, ex-estudante de Harvard e atualmente sócia-fundadora do Pluraliza, empresa que atua na promoção da diversidade no mercado de trabalho, disse ter se interessado pela "história dela, mas acredito que ela focou muito na meritocracia", disse. — Acho que ela falou pouco da música como informação e da situação de outras mulheres negras e pobres, que ainda vivem como ela vivia — disse.

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